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terça-feira, 26 de maio de 2015

"Na biblioteca": um poema de Manuel António Pina




Na biblioteca

O que não pode ser dito
guarda um silêncio feito
de primeiras palavras
diante do poema, que chega sempre demasiado tarde,


quando já a incerteza
e o medo se consomem
em metros alexandrinos.
Na biblioteca, em cada livro,


em cada página sobre si
recolhida, às horas mortas em que
a casa se recolheu também
virada para o lado de dentro,


as palavras dormem talvez,
sílaba a sílaba,
o sono cego que dormiram as coisas
antes da chegada dos deuses.


Aí, onde não alcançam nem o poeta
nem a leitura,
o poema está só.
E, incapaz de suportar sozinho a vida, canta.


Manuel António Pina


sábado, 4 de abril de 2015

Ela / "She walks in beauty, like the night..."




She walks in beauty, like the night
Of cloudless climes and starry skies;
And all that's best of dark and bright
Meet in her aspect and her eyes...

Lord Byron

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Pablo Neruda por M. Behroozi / Pablo Neruda by M. Behroozi


M. Behroozi


"Eu Simplesmente Amo-te  

Eu amo-te sem saber como, ou quando, ou a partir de onde. Eu simplesmente amo-te, sem problemas ou orgulho: eu amo-te desta maneira porque não conheço qualquer outra forma de amar sem ser esta, onde não existe eu ou tu, tão intimamente que a tua mão sobre o meu peito é a minha mão, tão intimamente que quando adormeço os teus olhos fecham-se".

Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor"

terça-feira, 28 de maio de 2013

A "Primeira Palavra" de Mia Couto




Mia Couto


Debruça o teu rosto
sobre a terra sem vestígio
prepara o teu ventre
para a anunciada visita
até que nos lábios humedeça
...
a primeira palavra do teu corpo


Do poema "Primeira palavra", no livro "Raiz de orvalho e outros poemas"

segunda-feira, 7 de março de 2011

"O poeta funcionário que dá nomes a coisas importantes"

"Num cubículo bafiento de um Ministério Secreto há um funcionário meticuloso que dá nomes a coisas do Estado. Podia ser um pequeno poeta, mas é apenas um homem que dá nomes a grandes coisas".




Boa prosa a do Pastor Pelejão, do blogue Três Pastorinhos, num texto publicado em  22 de Fevereiro de 2011. Aqui fica:


Desconfio que tudo é obra do Sr. Teixeira.

Diligente e poético Sr. Teixeira, um génio nos corredores plúmbeos dos ministérios que recorrem aos seus serviços de bico-de-pato afiado (o bico, não o pato).

O Sr. Teixeira é um daqueles lisboetas românticos e melancólicos que perscruta o céu dos decrépitos edifícios pombalinos como quem vislumbra pela primeira vez um quadro de Rubens e as suas ninfetas rosáceas e repolhudas de celulite.

De manhã, pela fresca, bebe a religiosa bica escaldada numa leitaria da Baixa, antes de caminhar a trote funcionário sobre os seus sapatos luzidios, de brio gasto, como os sonhos que se dissipam no esbanjar dos dias.

De ombros curvados e olhar de burocrata-forçado, o Sr. Teixeira cumprimenta com um aceno bovino o porteiro do ministério que cinge o polegar à pala, aborrecido e ignaro à pequenez ministerial do Sr. Teixeira.

Mas ali vai uma alma poética, embrulhada no fato de camurça de quatro estações e num nariz aduncado e lacrimoso de rinites, ali vai uma dor de poesia, um estribilho da solidão, da angústia, da ausência, do amor.

Ali vai um pungente lírico, como todos os maus poetas portugueses. Todos grandes na sua pequenez alada.

Figura microscópica na grande ordem das coisas ministeriáveis e talento poético apagado como uma beata no cinzeiro da indiferença, o Sr. Teixeira tem, no entanto, uma missão da mais altíssima importância para a Nação e quiçá, para a humanidade.

Sentado no seu cubículo bafiento no Ministério das Nomeações, em frente à velha secretária do tinteiro centenário, seco como as ideias de um político palavroso, o Sr. Teixeira, no seu anonimato amargo, vai dando expressão singela à sua verve poética, à sua inclemente verborreia de palavras declamáveis.

A poesia a uso da Nação. O Sr. Teixeira, qual O´Neill dos socorros a náufragos, é quem dá o nome às coisas públicas. Ali na sua escrivaninha-pia-baptismal nascem o nome das grandes coisas do Estado.

O nome dos altos-comissariados distribuídos a granel entre a corja esfaimada dos favores, é ele que os dá.

O título dos cargos inúteis que ornamentam a vaidade dos seus titulares, é ele que os dá.

É ele que dá também o nome às operações policiais que varrem o país de lés-a-lés, não dando descanso ao pilha-galinhas e ao carteirista, nem ao autarca corrupto ou ao banqueiro das traficâncias.

Com a pena inspirada do Sr. Teixeira, os polícias, os magistrados os inspectores encontram um desígnio, uma Cruz de Cristo que os guie na sua cruzada contra o Reino da Trafulhice Organizada que é Portugal.

"Operação Furacão" foi momento de inspiração meteorológica, gravado no coração do poeta-funcionário pelo tufão Katrina. Uma investigação que teria o mesmo efeito na alta finança mafiosa que o Katrina teve em Nova Orleãs. Devastador.

Não é culpa do Sr. Teixeira que depois a investigação acabe com falta de ar, de meios, de vontade, de tempo. Não é por culpa do Sr. Teixeira que o "Furacão" termine em apneia.

Também não é culpa do Sr. Teixeira que a belíssima Taxa Robin Hood, de clamor poético, benigno, justiceiro e igualitário, sirva apenas para o nosso Sheriff de Nottingham cobrar mais uns impostos, sem benefício plausível para os pobres.

O Robin Hood português rouba indiferenciadamente aos ricos e aos pobres, e enche os cofres do Estado. Não é Robin Hood, é mero gatuno. Mas disso, o Sr. Teixeira não tem culpa.

O Sr. Teixeira só dá o nome às coisas da Nação, mas não tem culpa de elas serem como elas são.

Se o Sr. Teixeira soubesse para que serve a Taxa Robin Hood, talvez lhe tivesse dado o mais apropriado nome de Taxa Benny Hill.

O que o Sr. Teixeira gostava mesmo era dar nomes às estrelas, aos planetas, às flores e aos rafeiros abandonados num canil pulguento.

Mas, como todos nós, o Sr. Teixeira tem de ganhar a vidinha, mesmo que ela seja má, anónima e indigna de nomeação. Se tivesse de nomear a própria vida, o Sr. Teixeira, chamar-lhe-ia "Operação desperdício".

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Corpo de Mulher... segundo Pablo Neruda e Cathy Delanssay




Corpo de Mulher...



Corpo de mulher, brancas colinas, coxas brancas,
pareces-te com o mundo na tua atitude de entrega.
O meu corpo de lavrador selvagem escava em ti
e faz saltar o filho do mais fundo da terra.
Fui só como um túnel. De mim fugiam os pássaros,
e em mim a noite forçava a sua invasão poderosa.
Para sobreviver forjei-te como uma arma,
como uma flecha no meu arco, como uma pedra
na minha funda.
Mas desce a hora da vingança, e eu amo-te.
Corpo de pele, de musgo, de leite ávido e firme.
Ah os copos do peito! Ah os olhos de ausência!
Ah as rosas do púbis! Ah a tua voz lenta e triste!
Corpo de mulher minha, persistirei na tua graça.
Minha sede, minha ânsia sem limite, meu caminho indeciso!
Escuros regos onde a sede eterna continua,
e a fadiga continua, e a dor infinita.


Pablo Neruda, in "Vinte Poemas de Amor e uma Canção Desesperada"

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

"Deus deve amar os loucos / Criou-os tão poucos..."

Valerie Bettis - Desperate Heart ,de Barbara Morgan, 1944

Poeta poderá andar vestido como quiser, com chapéus de nuvens, pés de estrelas binárias ou mantras de ninhos de borboletas. Nenhum Poeta será criticado por fazer-se de louco pois os loucos herdarão a terra e são enviados dos deuses. "Deus deve amar os loucos/Criou-os tão poucos..."

Assim fico mais descansada uma vezque não bato com o baralho todo! :))) Mas acho que não somos assim tão poucos...

A citação é de O Estatuto do Poeta de Silas Corrêa Leite que podem ler na íntegra AQUI.

sábado, 11 de dezembro de 2010

"Ladainha dos póstumos Natais" por David Mourão-Ferreira

"Where Santa Claus lives", 1900

Ladainha dos póstumos Natais


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido


Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito


David Mourão-Ferreira, in "Cancioneiro de Natal"

terça-feira, 13 de julho de 2010

A escrita enquanto necessidade, introspecção e criação

Vladimir Kush


"Go into yourself. Find out the reason that commands you to write; see whether it has spread its roots into the very depths of your heart; confess to yourself whether you would have to die if you were forbidden to write.



This most of all: ask yourself in the most silent hour of your night: must I write? Dig into yourself for a deep answer. And if this answer rings out in assent, if you meet this solemn question with a strong, simple “I must,” then build your life in accordance with this necessity; your whole life, even into its humblest and most indifferent hour, must become a sign and witness to this impulse. Then come close to Nature. Then, as if no one had ever tried before, try to say what you see and feel and love and lose...



...Describe your sorrows and desires, the thoughts that pass through your mind and your belief in some kind of beauty - describe all these with heartfelt, silent, humble sincerity and, when you express yourself, use the Things around you, the images from your dreams, and the objects that you remember. If your everyday life seems poor, don’t blame it; blame yourself; admit to yourself that you are not enough of a poet to call forth its riches; because for the creator there is not poverty and no poor, indifferent place. And even if you found yourself in some prison, whose walls let in none of the world’s sounds – wouldn’t you still have your childhood, that jewel beyond all price, that treasure house of memories? Turn your attentions to it. Try to raise up the sunken feelings of this enormous past; your personality will grow stronger, your solitude will expand and become a place where you can live in the twilight, where the noise of other people passes by, far in the distance. - And if out of this turning-within, out of this immersion in your own world, poems come, then you will not think of asking anyone whether they are good or not. Nor will you try to interest magazines in these works: for you will see them as your dear natural possession, a piece of your life, a voice from it. A work of art is good if it has arisen out of necessity. That is the only way one can judge it."

terça-feira, 13 de abril de 2010

O poder criador da palavra

"O que me move é a vocação divina da palavra, que não apenas nomeia mas que inventa e produz encantamento".
Mia Couto

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Chamem o poeta...melhor chamar um enxame deles! / Call the poet!




Da maneira que isto anda...precisamos de muitos!

CHAMEM O POETA, por Dilan Camargo

Está torta a recta?
Chamem o poeta.


Não se alcança a meta?
Chamam o poeta.


Querem desvirtuar o asteca?
Chamem o poeta.

A multidão se inquieta?
Chamem o poeta.

A plateia é selecta?
Chamem o poeta.

Algum mal nos afecta?
Chamem o poeta.

O Governo decreta?
Chamem o poeta.

A conta é secreta?
Chamem o poeta.

O tubo não excreta?
Chamem o poeta.

A dama é discreta?
Chamem o poeta.

O actor não interpreta?
Chamem o poeta.

O corrupto se locupleta?
Chamem o poeta.

Não adiantou a dieta?
Chamem o poeta.

Ninguém segue a seta?
Chamem o poeta.

O avô renega a neta?
Chamem o poeta.

O menino caiu da bicicleta?
Chamem o poeta.

Conflito burguês X proleta?
Chamem o poeta.

O lixeiro não faz colecta?
Chamem o poeta.

Não sai a eleição directa?
Chamem o poeta.

Chamem o poeta.
Se um for pouco
chamem um enxame.

Não importa que mais chamem
do que amem o poeta.

Chamem o poeta!
Chamem o poeta!


Mais poemas de Dilan Camargo aqui.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

O poeta em duas citações / The poet's job





"O poeta revolve os olhos, afia os dentes, destrava a língua aguda, prepara a voz tonitruante, abre a boca enorme, descomunal, apocalíptica, e atira: "piu".


Rui Manuel Amaral
Fonte: Dias Felizes


“The poet's job is to put into words those feelings we all have that are so deep, so important, and yet so difficult to name, to tell the truth in such a beautiful way, that people cannot live without it.” 
Jane Kenyon (Poet, E.U.A., 1947-1995)

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