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domingo, 11 de abril de 2010

Quando o crime vem como a chuva cai

Como alguém que chega com uma carta importante ao ghichet depois das horas regulamentares: o ghichet já está fechado.


Como alguém que quer advertir a cidade duma inundação: mas fala uma outra língua. Não o compreendem.


Como um mendigo que pela quinta vez bate a uma porta onde já recebeu esmola quatro vezes: ele tem fome pela quinta vez.


Como alguém cujo sangue lhe corre duma ferida e espera pelo médico: o sangue continua a correr.


Assim vimos nós e relatamos que em nós se cometem crimes.


Quando se relatou pela primeira vez que os nossos amigos eram abatidos pouco a pouco, houve um grito de horror. Então foram abatidos cem. Mas quando foram abatidos mil e a matança não tinha fim, espalhou-se o silêncio.


Quando o crime vem como a chuva cai, então já ninguém grita: alto!


Quando os delitos se amontoam, tornam-se invisíveis.


Quando as dores se tornam insuportáveis, já se não ouvem os gritos.


Também os gritos caem como a chuva de Verão.





Bertold Brecht, 1935


(in Poemas - Trad. Paulo Quintela)
 
Via Bruaá

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