Páginas

sábado, 3 de setembro de 2011

Quanto é "dez reis de esperança"?



Alguém me faz a conversão da moeda?


Dez reis de esperança



Se não fosse esta certeza
que nem sei de onde me vem,
não comia, não bebia,
nem falava com ninguém.


Acocorava-me a um canto,
no mais escuro que houvesse,
punha os joelhos à boca
e viesse o que viesse.


Não fossem os olhos grandes
do ingénuo adolescente,
a chuva das penas brancas,
a cair impertinente,


aquele incógnito rosto,
pintado em tons de aguarela,
que sonha no frio encosto
da vidraça da janela,


não fosse a imensa piedade
dos homens que não cresceram,
que ouviram, viram, ouviram,
viram e não perceberam,


essas máscaras selectas,
antologia do espanto,
flores sem caule, flutuando
no pranto do desencanto,


se não fosse a fome e a sede
dessa humanidade exangue,
roía as unhas e os dedos
até os fazer em sangue.

António Gedeão (1958)

Sem comentários:

Enviar um comentário