sábado, 18 de dezembro de 2010

Enid Wilson vem ao 'Cão' apresentar o seu novo romance escaldante / The steamy prose of Enid Wilson is here!

Sobre romances que adoramos, de que somos fãs confessos, que nos deixam com um apetite literário para mais do mesmo...

Diz Stephen King no seu brilhante On Writing, p. 154:

Sometimes it’s beautiful and we fall in love with all that story, more than any film or TV program could ever hope to provide. Even after a thousand pages we don’t want to leave the world the writer has made for us, or the make-believe people who live there. You wouldn’t leave after two thousand pages, if there were two thousand. The Rings trilogy of J. R. R. Tolkien is a perfect example of this. A thousand pages of hobbits hasn’t been enough for three generations of post–World War II fantasy fans; even when you add in that clumsy, galumphing dirigible of an epilogue, The Silmarillion, it hasn’t been enough. Hence Terry Brooks, Piers Anthony, Robert Jordan, the questing rabbits of Watership Down, and half a hundred others. The writers of these books are creating the hobbits they still love and pine for; they are trying to bring Frodo and Sam back from the Grey Havens because Tolkien is no longer around to do it for them.


E a propósito surge o conceito de "sequel". (Custa-me usar o termo "sequela" que por aí circula por recear pisar os calcanhares à Exma. Sra. D. Língua Portuguesa que muito respeito).


A sequel is a work in literature, film, or other media that portrays events set in the same fictional universe as a previous work, usually chronologically following the events of that work. In many cases, the sequel continues elements of the original story, often with the same characters and settings.



O que se passa com Tolkien (como mencionou Stephen King) acontece também com Jane Austen, especialmente com Orgulho e Preconceito. Apaixonamo-nos  pelo romance, pelas personagens, pelos diálogos, pelo ambiente georgiano do Reino Unido dos fins do Séc. 18. Quando o livro acaba a vontade de ler permanece. Ficamos presos de forma afectiva áquele universo ficcional. Queremos mais do mesmo, da mesma época, da mesma sociedade, das mesmas personagens, das suas vidas, dos seus gestos, das suas palavras. Queremos continuar a conviver com o reservado Mr. Darcy e a determinada Elizabeth Bennet.

Surgem então as mais diversas "sequels". Já li algumas. O curioso da relação do clássico inspirador com as actuais continuações da história está na dicotomia contenção - carnalidade.
 
Em Orgulho e Preconceito (como aliás em todos os romances de Jane Austen ) não chega a haver sequer um beijo romântico e o simples gesto de roçar a pele da mão do outro numa dança de salão constituirá o contacto mais íntimo, ousado e perturbador.
 
Por outro lado, todas as "sequelas" deste romance que conheço libertam-se da contenção de Jane e encarrilam por escaldantes relações carnais e descrições bastante explícitas de carácter erótico na consumação do amor entre Darcy e Elizabeth. Como se não houvesse fome que não desse em fartura! :)
Hoje recebo aqui, no Cão, em termos virtuais :), Enid Wilson, vinda directamente da quente e solarenta Austrália para a nossa fria e acinzentada invernia lisboeta. :)
Enid é autora de várias "sequels" escaldantes de Orgulho e Preconceito já publicadas e que podem conhecer no seu blogue.  Vem aqui apresentar o seu novo livro Fire and Cross.


É hoje, no próximo post, pelas 21 horas.




Uma leitora vestida a rigor para a quadra natalícia / Christmas reading illustration

Kanako and Yuzuru

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

"Chove. É Dia de Natal"...Fernando Pessoa no seu melhor :)

Chove. É dia de Natal.
Lá para o Norte é melhor:
Há a neve que faz mal,
E o frio que ainda é pior.


E toda a gente é contente
Porque é dia de o ficar.
Chove no Natal presente.
Antes isso que nevar.




Pois apesar de ser esse
O Natal da convenção,
Quando o corpo me arrefece
Tenho o frio e Natal não.




Deixo sentir a quem quadra
E o Natal a quem o fez,
Pois se escrevo ainda outra quadra
Fico gelado dos pés.



Fernando Pessoa

Acabou o Carnaval! Podem tira a FantaCIA.


Cartoon FantaCIA da Verdade, de Rodrigo

A biblioteca pública é o que há de mais democrático no mundo...


A public library is the most democratic thing in the world. What can be found there has undone dictators and tyrants: demagogues can persecute writers and tell them what to write as much as they like, but they cannot vanish what has been written in the past, though they try often enough. People who love literature have at least part of their minds immune from indoctrination. If you read, you can learn to think for yourself.

Doris Lessing

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

"Falavam-me de Amor",um poema de Natal de Natália Correia

Falavam-me de Amor


Quando um ramo de doze badaladas
se espalhava nos móveis e tu vinhas
solstício de mel pelas escadas
de um sentimento com nozes e com pinhas,


menino eras de lenha e crepitavas
porque do fogo o nome antigo tinhas
e em sua eternidade colocavas
o que a infância pedia às andorinhas.


Depois nas folhas secas te envolvias
de trezentos e muitos lerdos dias
e eras um sol na sombra flagelado.


O fel que por nós bebes te liberta
e no manso natal que te conserta
só tu ficaste a ti acostumado.

Natália Correia, O Dilúvio e a Pomba, 1979 

Deixa-te de críticas literárias! Cala-te e come! / Bookworms

Posted by Picasa

Uma girafa na biblioteca / A giraffe in the library



Brilhante ilustração. :)
Só tenho pena de não saber o nome do autor.
Posted by Picasa

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

"Litania do Natal" por José Régio

Tara Chang


Litania do Natal




A noite fora longa, escura, fria.
Ai noites de Natal que dáveis luz,
Que sombra dessa luz nos alumia?
Vim a mim dum mau sono, e disse: «Meu Jesus…»
Sem bem saber, sequer, porque o dizia.




E o Anjo do Senhor: «Ave, Maria!»
Na cama em que jazia,
De joelhos me pus
E as mãos erguia.
Comigo repetia: «Meu Jesus…»
Que então me recordei do santo dia.




E o Anjo do Senhor: «Ave, Maria!»
Ai dias de Natal a transbordar de luz,
Onde a vossa alegria?
Todo o dia eu gemia: «Meu Jesus…»
E a tarde descaiu, lenta e sombria.




E o Anjo do Senhor: «Ave, Maria!»
De novo a noite, longa, escura, fria,
Sobre a terra caiu, como um capuz
Que a engolia.
Deitando-me de novo, eu disse: «Meu Jesus…»




E assim, mais uma vez, Jesus nascia.






José Régio

Mais uma leitora de Jean Honore Fragonard

 

Publiquei outra leitora de Fragonard AQUI.

O "Natal" por Manuel Alegre



Natal

Acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
Era gente a correr pela música acima.
Uma onda uma festa. Palavras a saltar.



Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima.
Guitarras guitarras. Ou talvez mar.
E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.




Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia.
No teu ritmo nos teus ritos.
No teu sono nos teus gestos. (Liturgia liturgia).
Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos.
E nos silêncios infinitos. Na tua noite e no teu dia.
No teu sol acontecia.




Era um sopro. Era um salmo. (Nostalgia nostalgia).
Todo o tempo num só tempo: andamento
de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia.
Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva
acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva
na cidade agitada pelo vento.




Natal Natal (diziam). E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia.






Manuel Alegre

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

"Dia de Natal" por António Gedeão: pleno de crítica e ironia

Brian Fairrington (Cagle Cartoons)



Dia de Natal




Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.



É dia de pensar nos outros— coitadinhos— nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.




Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,
Entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.




De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)




Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos, esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam mais distante.




Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica.




Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos e favores.




A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
e compra— louvado seja o Senhor!— o que nunca tinha pensado comprado.




Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.




Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha,
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama.




Ah!!!!!!!!!!



Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.




Jesus
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.




Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem mortas:


Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.




Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.




Dia de Confraternização Universal,
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.
É dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.

António Gedeão

Uma canção que nos toca, comove...

Damien Rice canta "The Blower's Daughter": "I can´t take my mind off you"...





A jovem Carolina Deslandes, concorrente da presente edição de Ídolos, cantou esta canção muito bem:

O valor da imaginação / Imagination is a very valuable thing

Unleashed Imagination, de Enkel Dika


Because,” explained Mary Rommely simply, “the child must have a valuable thing which is called imagination. The child must have a secret world in which things that never were. It is necessary that she believe. She must start out by believing in things not of the world. Then when the world becomes too ugly for living in, the child can reach back and live in her imagination. I, myself, even in this day and at my age, have great need of recalling the miraculous lives of the Saints and the great miracles that have come to pass on earth. Only by having these things in my mind can I live beyond what I have to live for.

Betty Smith, A Tree Grows in Brooklyn


LinkWithin

Blog Widget by LinkWithin