segunda-feira, 10 de junho de 2013

Lisa Bu: How books can open your mind

domingo, 9 de junho de 2013

Chove... diz José Gomes Ferreira


José Gomes Ferreira (que nasceu a 9 de Junho de 1900, no Porto. Faleceu em 1985)



Chove...

Mas isso que importa!,
se estou aqui abrigado nesta porta
a ouvir a chuva que cai do céu
uma melodia de silêncio
que ninguém mais ouve
senão eu?

Chove...

Mas é do destino
de quem ama
ouvir um violino
até na lama.

                                                   José Gomes Ferreira

O Tango




O Tango

Onde estarão? Pergunta a elegia
Sobre os que já não são, como se houvesse
Uma região onde o Ontem pudesse
Ser o Hoje, o Ainda, o Todavia.

Onde estará (repito) esse selvagem
Que ergueu, em tortuosas azinhagas
De terra ou em perdidas plagas,
A seita do punhal e da coragem?

Onde estarão aqueles que passaram,
Deixando à epopeia um episódio,
Uma fábula ao tempo, e que sem ódio,
Lucro ou paixão de amor se esfaquearam?

Procuro-os na lenda, na apagada
Brasa que, como uma indecisa rosa,
Conserva dessa chusma valorosa
De Corrales e Balvanera um nada.

Que escuras azinhagas ou que ermo
Do outro mundo habitará a dura
Sombra daquele que era sombra escura,
Muranã, essa faca de Palermo?

E esse Iberra (tenham dele piedade
Os santos) que na ponte duma via,
Matou o irmão, Ñato, que devia
Mais mortes que ele, ficando em igualdade?

Uma mitologia de punhais
No esquecimento aos poucos se desgasta.
E dispersou-se uma canção de gesta
Em sórdidas notícias policiais.

Há outra brasa, outra candente rosa
Dos seus restos totais conservadores;
Aí estão os soberbos matadores
E o peso da adaga silenciosa.

Embora a adaga hostil ou essa adaga,
O tempo, os dispersassem pelos lodos,
Hoje, p’ra além do tempo e da aziaga
Morte, no tango vivem eles todos.

Na música prosseguem, na mensagem
Das cordas da viola trabalhosa,
Que tece na toada venturosa
A festa, a inocência da coragem.

Vejo a roda amarela circular
Com leões e cavalos, oiço o eco
Desses tangos de Arolas e de Greco
Que vi bailar no meio da vereda,

Num instante que emerge hoje isolado,
Sem antes nem depois, contra o olvido,
E que tem o sabor do que, perdido,
Perdido está mas foi recuperado.

Os acordes conservam velhas cousas:
Ou a parreira ou o pátio ancestral.
(E por trás das paredes receosas
O Sul tem uma viola, um punhal.)

O tango, essa rajada, diabrura,
Os trabalhosos anos desafia;
Feito de pó e tempo, o homem dura
Menos que a leviana melodia,

Que é tempo somente. O tango cria
Um passado irreal, real embora.
Recordação que não pôde ir-se embora
Morta na luta, algures na periferia.

Jorge Luis Borges

Trad. Ruy Belo

sábado, 8 de junho de 2013

"...estamos cheios de histórias" / Storytelling




“Os cientistas dizem que estamos cheios de átomos, mas um

passarinho me contou que estamos cheios de histórias.”


Eduardo Galeano

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Poema para um livreiro / Poem for a bookseller



Livraria na Dinamarca (em Naestved), 1899


The Bookseller

Bookseller, Bookseller, why do you weep?
Because I must sell my books far too cheap.

Bookseller, Bookseller, why do you grin?
Because an old lady is just coming in.

Bookseller, Bookseller, why all this joy?
Because she requires a nice book for a boy.

Bookseller, Bookseller, why do you cough?
Ahem! Well, the discount forgot to come off.

Bookseller, Bookseller, why are you gay?
Beause it's my best of business to-day.

Bookseller, Bookseller, why are you mad?
Because the half-sovereign I changed her is bad.

JJ Bell

in "Jack of all Trades", Londres, 1900


domingo, 2 de junho de 2013

Quanta poesia e quanto palato português nesta "Salada de Alface"!!!



Salada de Alface

Se és algo panteísta e tens bem vivo
Esse afago ideal
Do retrocesso ao homem primitivo,
Que nos tempos pré-histórico vivia
Muito perto do lobo e do chacal;
Se um ligeiro perfume de poesia
Que se ergue das campinas
Na paz, no encanto das manhãs tranquilas,
Te dilata as narinas
E enche de gozo as húmidas, -
Leitor amigo, se assim és, vou dar-te
“Se a tanto me ajudar engenho e arte”
uma antiga receita,
que os rústicos instintos te deleita
e frémitos te põe na grenha hirsuta.
Leitor amigo, escuta:

Vai, como o padre cura, cabisbaixo
Pelos vergeis da tua horta abaixo
Quando no mês d’ Abril, de manhã cedo,
O sol cai sobre as franças do arvoredo,
Para sorver aqueles bons orvalhos
Chorados pelos olhos das estrelas
Nos corações dos galhos;
Passarás pelas couves repolhudas, -
Cuidado, não te iludas,
Nem te importes com elas, -
Vai andando...
Mas logo que tu passes
Ao campo das alfaces,
Pára, leitor amigo,
E faze o que te digo:
Escolhe d’ entre todas a mais bela,
Folhas finas, tenrinhas e viçosas
Como as folhas das rosas,
E enchendo uma gamela
D’ água pura e corrente,
Lava-a, refresca-a cuidadosamente.
Logo em seguida (e é o principal)
Que a tua mão, sem hesitar, lhe deite
Um fiozinho de azeite,
Vinagre forte e sal,
E ouvindo em roda o lúbrico sussurro
Da vida ansiosa a propagar-se, que erra
Em vibrações no ar,
Atira-te de bruços sobre a terra
E come-a devagar,
Filosoficamente, como um burro!

António de Macedo Papança, 1º Conde de Monsaraz (1852-1913) – Musa Alentejana

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